Auxiliados por muito jogo de luz, com as intermitências típicas de Godard, o casal discute o significado do mais paradoxal dos sentimentos, construindo toda uma atmosfera de romantismo, mas também de reflexão, em torno da poesia de Paul Éluard.
Godard tem o cuidado de conciliar os versos de "Capitale de la Douleur" com os movimentos de Natacha e Caution, reunindo todo o conjunto sob um fundo musical totalmente oportuno e envolvente.
Realmente, é uma magnífica cena! O filme já é obra consagrada, mas não poderia, depois de assisti-lo pela quarta vez, deixar de registrar esse momento áureo da película.
Os versos são ditos correntemente. Cometendo o pecado de traduzi-los (toscamente):
"Tua voz, teus olhos, tuas mãos, teus lábios
Nosso silêncio, nossas palavras
A luz que se vai
A luz que volta
Um só sorriso para nós dois
Por querer saber, vi a noite criar o dia
Sem que mudássemos de aparência
Oh, bem-amado de todos e bem-amado de um só
Em silêncio, tua boca promete ser feliz
Quanto mais longe, diz o ódio
Quanto mais perto, diz o amor
Pela carícia, deixamos nossa infância
Vejo cada vez melhor a forma humana
Como um diálogo de amantes
O coração tem uma só boca
Todas as coisas ao acaso
Todas as palavras ditas, impensadas
Os sentidos à deriva
Os homens giram na cidade
O olhar, a palavra
E o fato que eu te amo
Tudo está em movimento
Basta avançar para viver
Seguir em linha reta
Na direção de tudo o que amamos
Eu ia em sua direção
Eu ia na direção da luz
Se você sorri, é para melhor me invadir
Os raios dos seus braços descerram a névoa".
Desculpem por um outro post de caráter cinematográfico, mas não podia deixar passar.
"Basta avançar para viver
Seguir em linha reta
Na direção de tudo o que amamos
Eu ia em sua direção.
Eu ia na direção da luz".
No mínimo, é bastante inquietante. O amor como guia, o amor como razão, por mais incoerente que isso pareça. Talvez o filme de Godard nos ajude a enxergar com mais lucidez alguns dos enigmas humanos.
Eddie Constantine e Anna Karina em "Alphaville", de Jean-Luc Godard.
2 comentários:
Eu lembro de ler alguma coisa sobre a questão de todos os problemas da Humanidade serem resolvidos pelo cinema... E não é o caso? Acho que se há pessoas gabaritadas o suficiente para decifrar os enigmas humanos pelo cinema, uma delas é o Godard!
Assino embaixo, Gui! Com Godard, a cada filme, se questões não são respondidas, elas pelo menos ganham uma boa dimensão para discussão!
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