quinta-feira, abril 26, 2007

No dia do sol

Como uma lua mágica, vejo uma luz que seria divina se Deus realmente existisse.

E nas ruas sombrias, nos becos escuros, sujos e alagados pelo mais estridente silêncio, penso. Penso, penso, mas não raciocino. Não raciocino.

Os lapsos ficam cada vez mais evidentes.

Clareado pelo espasmo da inconsciência, vago inconstante pela minha própria mente desorientada, juvenil, imatura...

As noites me convidam à felicidade. As noites me fazem sentir “eu”, com ebulição de pensamentos, efervescência de constatações, iluminado... iluminado pela luz da lua mágica.

È da morrire! O d’amare? Louder.

Na torre das três verdades, descubro algo distinto. No cume daquele mundo, ouço algo. Ouço, mas não compreendo. A cidade parece abraçar a torre e, naquele encontro imerso em contigüidade, sinto-me outro. O lugar já não é o mesmo. É encantado agora.

Bocas falantes, mas, mais do que isso, mentes pensantes. A reflexão permeia a fantasia e a fantasia faz da realidade algo além do especial.

A dimensão do mundo não é suficiente. É preciso transpô-la. Mergulhando na irrealidade, percebemos um novo mundo e o abraçamos. Ternamente!

O Apolo dionisíaco. O olhar me intriga. Me desperta. Me aponta. Reflections.

Na sintonia da minha alma, percebo passos. Alguém se aproxima.

A procura pelo sentido de tudo nos une e a estrela da inocência nos coloca em similitude. A desconexão se torna coesa. As trevas tornam-se azuis. E eu encontro aquele Deus.

A sombra agora não é mais desnorteadora, está esclarecida. E a lua mágica está ainda mais bonita, mais bonita. Pronta para conceber o sol.

Ouvindo: Fortissimo - Rita Pavone

domingo, abril 22, 2007

Indecência

No último sábado, fui prestigiar a mais nova estréia do TUSP: Abajur Lilás. Peça de Plínio Marcos, mereceria um post só pra ela. Mas não é o meu objetivo nesse caso. O que quero apresentar aqui é algo que não deixa de ser asqueroso e cortante como o seu texto, algo que me aconteceu no hall de entrada daquele teatro.

Ao entrar, perguntei ao segurança onde estavam sendo vendidas as entradas. Ele então me indicou a direção do guichê, para onde eu me dirigi. Só que, ao perguntar, um rapaz, que estava com uns malabares, intercedeu e disse algo que não me recordo, mas que era referente ao espetáculo. Outras pessoas ali presentes ouviram e disseram que não era nada ofensivo. Era apenas uma informação.

Ao pegar meu ticket, ouço alguns ruídos de inquietação. Eu, que sou eu, não ficaria ali sem saber do que se tratava. Fui até o hall e presenciei umas das cenas mais violentas da minha vida, se não a mais violenta. Os seguranças, em número de três, estavam sufocando e conduzindo o menino para fora do prédio. Eram três homens já de uns 40 ou 50 anos agredindo um menino da minha idade, um menino que havia comprado sua entrada para ver teatro e, por que não de alguma forma, o espetáculo da sua própria vida.

Alguns minutos depois, a polícia chegou e quis ouvir a versão de cada um. Eu e os que estavam ali no hall ficamos só observando qual seria o teor do discurso do agressor principal. Primeiro ele disse que o garoto estava "fazendo barulho" com seus malabares e atrapalhando a peça que estava sendo encenada embaixo. Duas mentiras. Os malabares não eram nada de mais e não faziam barulho e não havia nenhuma peça em apresentação. Depois o segurança alegou que o menino havia mentido sobre a compra do ingresso, uma vez que a entrada era gratuita. Outra mentira. Não era gratuita e o menino estava correto.

Eu olhei aquilo e me revoltei muito. Estava presenciando uma mentira deslavada. Algo que eu havia presenciado e que tinha absoluta certeza da injustiça cometida contra o menino.

Comecei a conversar com uma mulher que ali estava, acompanhada de seu marido, e comentei sobre o ato violento do segurança. Nós estávamos indignados. Ela então disse: "Vamos lá contar ao policial a verdade". O marido dela, provável marido, quis impedi-la, alegando que nada ia adiantar. Eu, e sinto muita vergonha desses três segundos de hesitação, hesitei num primeiro momento. Só que, ao olhar para o menino e pensar no que havia visto, na injustiça que havia presenciado, naquele ato que representava apenas uma das inúmeras injustiças cometidas com essa camada excluída, me lembrei do que meu pai sempre me fala, algo que meu avô já dizia: "Você é um homem ou um rato?".

Aquilo me pegou de jeito. Eu saí dali com a mulher e fomos dizer ao policial sobre o que havíamos preseciado. Um outro menino ali presente completou os discursos das testemunhas. O policial então aconselhou o rapaz a prestar queixa. No entanto, nem documento ele portava.


O que aconteceu depois não ficamos sabendo bem ao certo. A entrada foi liberada e todos entramos para assistir à peça. Mas o mais irônico é que no espatáculo da violência ou no espetáculo do Plínio Marcos uma só questão latejou naquele espaço: a exclusão. A exclusão que era encenada ali no andar de baixo, como ficção, tinha se manifestado, como realidade, ali, dois metros acima.

Mas a ironia não termina por aí. Na surrada parede daquele prédio histórico da Maria Antonia, pendia uma também surrada placa de mármore, já bastante encardida pelo tempo. Algo bem simples que dizia: "Homenagem aos que combateram a ditadura".

sábado, abril 21, 2007

Teorema

Uma camada sobrevive alienada sem ter ciência da sua alienação.

A outra camada se utiliza de todos os instrumentos possíveis para a manutenção do status quo, ou seja, faz de tudo pra que ela continue alienada.

Por quê?

Porque se a iluminação viesse à cada uma dessas cabeças oprimidas, elas enxergariam a falta de sentido de suas vidas e, com certeza, poderiam desejar a morte.

Mas a sua morte seria também a morte da dominação. O corolário disso tudo: o fim da camada que domina.

A diferença: essa camada está ciente do perigo.

A ameaça: a cultura.

Portanto: pra que democrátizá-la?



É possível sair do círculo vicioso. É possível, mas é dificíl.

Mas é possível.

Essas são reflexões de um sábado à noite, depois de uma peça instigante, áspera e suja de realidade.

quinta-feira, abril 19, 2007

Por NADA

Tive uma grande surpresa hoje. Algo que, de certa forma, me fez reviver algumas lembranças ou ainda sensações de alguns anos atrás. Estava conversando com meu pai, ou melhor, "teclando" com ele (conversamos muito pouco por telefone), quando ele disse que tinha uma novidade.

Eu: "Novidade? Boa ou ruim?"
Ele: "Não sei se você vai se interessar".

Eu: "O que é?"
Ele: "Tudo indica que a cidade terá uma faculdade de Medicina. E federal ainda. O Geraldo conseguiu trazer".

Por um certo momento não acreditei. Sempre explorei essa possibilidade quando lá estava. Sonhei com isso. Queria fazer medicina, mas não perecer 3 anos num cursinho. Um curso lá seria ideal. Mas enfim, nada aconteceu.

Quando meu pai disse que a cidade provavelmente terá essa faculdade de medicina, eu revivi sensações de muito tempo. Sensações que eu tinha quando pensava que podia continuar na minha cidade, fazendo um curso que era meu objetivo durante uma considerável época na minha empreitada pelo campo das profissões.

Ele ainda brincou (acho que brincou): "Termina aí e vem fazer medicina aqui". Hahahaha Eu ri.

Eu ri e comecei a pensar no que tinha feito. Enveredei pela Comunicação Social, tendência marcante desde a minha mais tenra idade. Vim pra essa cidade, onde sempre sonhei viver.

Eu: "Não conseguiria viver aí mais".
Ele: "Você já é um paulistano nato".

Eu ri. Pensei nos caminhos que tinha seguido. Nas perspectivas que tinha quando fazia o Ensino Médio. Nunca pensei que podia encontrar esse mundo e as pessoas que encontrei. Não tive vontade de voltar e fazer medicina. Não. De maneira alguma. Estou satisfeito com esse caminho que escolhi. Mas apenas me lembrei de como eu almejava essa faculdade lá, e como eu pensava na perfeição desse acontecimento, que na época era a "perfeição". Hoje é um mero fato.

Isso só evidencia pra mim a minha escolha e a minha satisfação por tê-la feito. Não troco essa cidade, não troco pessoas especiais que conheci, não troco o teatro, não troco meus amigos daqui por NADA. Isso só me deu a certeza de que não os troco por NADA.

Ouvindo: Alexi Murdoch - Song for you

terça-feira, abril 17, 2007

Volver

Yo adivino el parpadeo
de las luces que a lo lejos van
marcando mi retorno
son las mismas que alumbraron
con sus pálidos reflejos
hondas horas de dolor
y aunque no quize el regreso
siempre se vuelve a su primer amor
la quieta calle, donde el eco dijo
tuya es mi vida, tuyo es mi querer
bajo el burlón, mirar de las estrellas
que con indiferencia, hoy me ven volver
Volver con la frente marchita
las nieves del tiempo, platearon mi sien
sentir que es un soplo la vida,
que veinte años no es nada
que febril la mirada
errante en la sombras te busca y te nombra
Vivir con el alma aferrada a un dulce recuerdo
que no ha de volver.
Tengo miedo del encuentro con el pasado
que vuelve a enfrentarse con mi vida
tengo miedo de las noches que pobladas
de recuerdos encadenan mi sufrir
pero el viajero que huye,
tarde o temprano detiene su andar
mas el olvido que todo destruye
haya matado mi vieja ilusión
Guardo escondida una esperanza humilde
que es toda la fortuna de mi corazón.


Carlos Gardel


Siempre... siempre volviendo. You he rizado el rizo para lograrlo!

sábado, abril 14, 2007

Chrismukkah!

Depois de 4 temporadas e um final já esperado, quero reservar um espaço aqui para "The O.C.", que teve seu último episódio apresentado agora na quinta-feira. Apesar de guardar muitas semelhanças com outras séries - não há como fugir do estilão - The O.C. tinha muita coisa de inovador e contagiante.

Começa pelo roteiro. O Josh Schwartz, apesar de muito jovem, conseguiu construir uma trama bem interessante, em que há uma certa humanização dos ricos, mostrando milhões de tragédias, fracassos e infelicidades que outros modelos de ficção televisiva procuram esquecer. Tem sim o clichezinho da menina rica, linda e frustrada que busca se aventurar por outros mundos em busca de prezeres. Há tembém a ambiciosa pobre que consegue ascender socialmente graças a um bom casamento. E também o desamparado, vítima da exclusão social que, embora seja Estados Unidos, sofre de dramas similares aos de alguns jovem brasileiros, que não são poucos.

Mas o mais interessante é que, apesar dos estereótipos, era uma série muito querida. Questões técnicas estão fora de discussão. Muito bem rodada, ângulos legais e, às vezes, até bem ousados. Claro que o cenário ajuda: Newport Beach reflete tudo o que a Califórnia nos faz lembrar: sol, praia, calor, festinhas... Sem contar que tudo é realizado na parte rica da cidade, região de grandes condomínios, com paisagens maravilhosas.


Pra mim uma das melhores coisas, se não a melhor, foi a trilha sonora. Apresentaram-se uma série de caras novas ou ainda pouco conhecidas, na época, aqui no Brasil. Fizeram parte do repertório Killers, Eels, Jem, 88, Phantom Planet, Alexi Murdoch, Rooney... Todos com músicas que se encaixaram muito bem nas cenas de conflito ou ainda nos momentos de curtição envolvendo as personagens.

O Ben Mckenzie atuou bem sim mas eu quero destacar é o papel do Adam Brody. Com certeza o "Seth" foi uma das sacadas mais autênticas do seriado. Personagem com uma infância meio problemática e um perfil de solitário, o Seth tinha um estilinho de vestir e um gosto musical muito parecidos aos meus, daí talvez a minha grande identificação com ele, desde o começo da primeira temporada.

Sinceramente, desde quando ouvi os primeiros rumores de queda de audiência nos Estados Unidos, já tinha uma previsão de que a série não iria durar mais que isso. Pra falar a verdade, não achava que ia chegar até uma quarta temporada. Enfim, talvez ela se prolongasse por um tempinho a mais, caso a Mischa não saísse. Mas isso é só um palpite.




Pra relembrar a primeira temporada:
Ben Mckenzie, Mischa Barton, Adam Brody e Rachel Bilson.

Ouvindo: Nada Surf - If You Leave.

terça-feira, abril 10, 2007

Infân...

Se formos observar os principais episódios da história da humanidade, poderemos identificar, como coloca o próprio Marx, um processo relativamente cíclico, a partir do qual uma série de situações semelhantes marcam diferentes épocas.

Dizer que a História constitui-se em uma estrutura cíclica seria categórico demais. É certo que observamos fenômenos com um certo caráter de recorrência, mas atribuir a isso a qualidade de ciclo é negar a identidade entre todos os seres humanos. Explico isso.

Um homem, apesar de toda a individualidade que o singulariza, é dotado de algo de substancial, uma essência que o torna indentificável aos outros homens. Não diríamos que seria algo permanente, imutável, ou ainda da forma como trata Maquiavel, mas mais um ponto de ligação entre os constituintes da espécie humana. E por que digo isso? Não que tenha uma concepção fundamentada e pronta, mas acredito que a recorrência de alguns fenômenos deve-se menos a um "ciclo" do que à manifestação dessa essência humana. A manifestação de uma essência que, ao longo dos tempos, foi determinando certos episódios muito similares entre si.

Refiro-me a tudo isso para chegar ao assunto que realmente gostaria de comentar. Comecei a constatar, depois de alguns insights, o processo de "adultização" - não sei se emprego corretamente o substantivo - sofrido pela criança nos últimos anos. E porque isso é interessante? Porque, salvas as especificidades, a visão da criança como adulto já foi observada em outros momentos da História, com destaque para a mentalidade medieval.

Estava eu observando como, e cada vez mais, as crianças estão se parecendo com seus pais. Não só na aparência externa, com roupas cada vez mais apelativas e, muitas vezes, beirando a vulgaridade, mas também no método de encarar as coisas. As crianças estão cada vez mais críticas, porém num sentido de independência e de seguirem uma linha própria de vida. Tudo isso com uma diferença em relação à Idade Média: um grande sistema econômico, ancorado pelos mais poderosos instrumentos de persuasão - e por que não coerção -, que faz da criança um target estratégico para o seu ataque.

É curioso observarmos esse processo. E mais interessante é tecer uma conjuntura futura: como será o perfil da criança daqui a 50 anos? Será que será vista como um "adulto pequeno", como há séculos atrás? Porque na Idade Média, crianças presenciavam sem problemas cenas de sexo entre os pais e viviam de forma relativamente independente.

Se antes a criança não era "privada" - como vai se tornar com a estruturação da célula familiar burguesa - e tinha sua tutela resguardada na prática não pelos pais mas pela coletividade, hoje nós observamos uma conjuntura parecida. Só mudaram, fundamentalmente, os sujeitos do controle: hoje um sistema econômico absolutmente dinâmico e que caminha numa direção já previsível.

Ao constatar essa morte da infância fico, não sei se devido a nostalgia, fico meio triste. Sei que é uma construção histórica, como a figura da "mãe", do "pai" e da "família". Mas eu creio, que fora as minhas fraquezas nostálgicas, ser criança, e de uma forma bem categórica, é algo extremamente necessário para a construção de um adulto centrado, com um ego seguro, sadio e favorável ao seu desenvolvimento a posteriori.

Tomara que não tenhamos um retrocesso. Que o que adquirimos em todos esses anos, com os avanços das ciências humanas, possa nos "iluminar" mais uma vez, mas no sentido do desenvolvimento humano e da formação de uma sociedade menos numérica. A humanidade da criança é um dos únicos encantos que ainda nos restam...

sábado, abril 07, 2007

In a cloudy day

Como são "nebulosos" esses dias nublados! Estão certos em dizer que o clima influencia no humor e na disposição do corpo humano. Esses dias em que o sol não dá as caras realmente mexem comigo. Depois de acabar uma série de tarefas, eu me deparo com uma tarde chuvosa, com resquícios de feriado, já anunciando um domingo sem Macu. Sem Macu!!!

Eu gostava de dias assim. Me lembro de ainda comentar com amigos meus que eu adorava dias nublados, dias sem sol, dias com tardes escuras e céus de chuva iminente. Isso me lembra a biblioteca da minha escola. Eu amava aquela biblioteca, principalmente em dias assim: dias de tardes feias. Aquele lugar parecia a minha fortaleza. É certo que reunia um acervo legal, mas parece que o mais prezairoso nem era isso: era todo aquele ambiente, aquele prédio que contava muitas histórias, muitas.

Mas eu mudei. E comigo mudaram muitos dos meus gostos. Uma das transformações foi essa: hoje aprecio dias ensolarados, com muito calor, dias que não me fazem mais pensar na biblioteca da escola, mas (por incrível que pareça) me lembram das minhas viagens de criança a Ubatuba, em algum dos seus raros dias em que o céu azul resolve nos fazer uma visita.

Não sei. Nem sei. Acho que o pior é um infeliz vizinho que resolveu aprender a tocar tompete! Eu não agüento mais... Sério.

Mas, sabe o que eu sempre imaginei? Acima dessa cobertura feia de nuvens tem sempre um grande céu azul, limpinho, quietinho e pronto pra ser desbravado...

Desculpem a alternância de idéias.


Ouvindo: Bruce Springsteen - Born to Run.

sexta-feira, abril 06, 2007

Gnossienne N.3

Nossa! Que sensação estranha essa que acabei de ter dentro do meu quarto! Espaço vazio, casa vazia, sem o único amigo daqui que ainda me resta! Minha mãe me liga e faz chantagem emocional. Falo com meu amigo, que está em outro estado. Que saudade! Que saudade de pessoas! De ver pessoas!








Porque o que aqui eu tenho é um indivíduo que me torra a paciência todos os dias; um ser que se esconde atrás de uma religião e acha que está imune a todo o mal que proclama. Será mesmo que está? Chego e os olhos dela e sua modesta corja (faço justiça a alguns, que são pessoas de bem, admito) me acompanham até minha porta; olhos que me concebem de acordo com o julgamento à revelia que ela já fez de mim durante o seu fatídico jantar de "Sexta-feira santa". Tenho certeza que comentaram a minha passagem pela cozinha, assoberbado, dizendo um "boa noite" falso, convencional e sem nenhum efeito. O meu trash pedágio.

Uma situação horrível, após momentos tão especiais que passei hoje. Bem que uma professora minha dizia que não há nada melhor nesse mundo que uma ótima companhia. Não há, viu! Não há. Passar momentos tão agradáveis, tão especiais, tão mágicos. Trocar desejos, confidências, existencialidades... Uma companhia singular porque está totalmente sintonizada comigo no momento; dedica a sua atenção de forma tão tocante... Me faz confiar tanto nela... E eu a entendo tanto! E ela me entende tanto! Como nunca outra pessoa me entendeu antes... Que bom! Que bom que pude encontrá-la! E eu digo, pleno, que valeu a pena viver até aqui.

É isso que me levanta. Fico chateado com as ocasiões cada vez mais constrangedoras pelas quais passo aqui, na minha própria casa. E esse quarto é o meu refúgio. O meu refúgio nesse ambiente hostil, que não me deseja. Mas me levanto e, após algum tempo me sentindo só, eu penso nessas coisas boas, lembro-me de flashes, de frases, palavras que eu poderia ficar ouvindo pelo resto da minha vida... Em plenitude.

Ouvindo Erik Satie.

domingo, abril 01, 2007

C.R.A.Z.Y.

Um comentário...

Parece mesmo louco, mas na verdade está repleto de sentido. Falo do mais recente filme de Jean-Marc Valée: C.R.A.Z.Y. Me surpreendeu. Apesar de ter ouvido boas recomendações, não imaginava que veria algo tão bem delieneado, tão bem construído e montado. Vejo no filme a união de uma série de elementos que eu não conseguia ver, já há um certo tempo, em um filme só.

O roteiro é realmente muito bom. Apesar de girar em torno de uma família do Canadá francês com traços típicos da década de 60, o enredo não tem nada de clichê. Para apresentar a conturbada e confusa construção da personalidade de Zachary, o quarto dos cinco filhos do casal formado por Michel Côté e Danielle Proulx, o filme é recheado de características que me fazem sentir saudade de uma época que nem mesmo vivi.

Não posso deixar de fazer referência à trilha sonora. O que é aquilo? Raras vezes vi tanto clássico bom, e dos mais variados estilos, compondo toda a atmosfera de uma história filmada. Com certeza, Rolling Stones, David Bowie, Patsy Cline, Aznavour me influenciaram para gostar ainda mais do filme. Mas é claro que ele é bom por uma série de outros fatores.

Aplausos para o Marc-André Grondin! Acho que ele conseguiu representar muito bem a rebeldia da época mas também tudo de excêntrico que envolve a sua personagem. O filme é feito de cenas que merecem um espacinho na memória: o pai Beaulieu cantando "Emmenez moi", o Zac dublando “Space Oddity” (que pra mim é uma das melhores cenas do filme), a sua caminhada pelo deserto, sem contar a discussão decisiva, debaixo de chuva, com seu pai...

Achei fantásticas aquelas passagens em que o Zac dizia que se ele sobrevivesse àquela situação de risco ele se curaria dos seus males. Senti uma certa nostagia nesses momentos...

Mas o que mais julguei importante é que fica bastante evidente o conflito entre o "Zac-essência" e o "Zac-aparência". Além da questão da sexualidade, o roteiro consegue tecer direitinho como uma série de problemas ou ainda questões delicadas de sua infância irão determinar o seu futuro "eu adulto", um "eu" que conseguirá se afirmar negando-se.

Sem falar de "Crazy", que, nada de especial, sempre foi uma das minhas músicas.




Zac (Marc-André Grondin), logo depois de dublar
o
David Bowie.