terça-feira, abril 10, 2007

Infân...

Se formos observar os principais episódios da história da humanidade, poderemos identificar, como coloca o próprio Marx, um processo relativamente cíclico, a partir do qual uma série de situações semelhantes marcam diferentes épocas.

Dizer que a História constitui-se em uma estrutura cíclica seria categórico demais. É certo que observamos fenômenos com um certo caráter de recorrência, mas atribuir a isso a qualidade de ciclo é negar a identidade entre todos os seres humanos. Explico isso.

Um homem, apesar de toda a individualidade que o singulariza, é dotado de algo de substancial, uma essência que o torna indentificável aos outros homens. Não diríamos que seria algo permanente, imutável, ou ainda da forma como trata Maquiavel, mas mais um ponto de ligação entre os constituintes da espécie humana. E por que digo isso? Não que tenha uma concepção fundamentada e pronta, mas acredito que a recorrência de alguns fenômenos deve-se menos a um "ciclo" do que à manifestação dessa essência humana. A manifestação de uma essência que, ao longo dos tempos, foi determinando certos episódios muito similares entre si.

Refiro-me a tudo isso para chegar ao assunto que realmente gostaria de comentar. Comecei a constatar, depois de alguns insights, o processo de "adultização" - não sei se emprego corretamente o substantivo - sofrido pela criança nos últimos anos. E porque isso é interessante? Porque, salvas as especificidades, a visão da criança como adulto já foi observada em outros momentos da História, com destaque para a mentalidade medieval.

Estava eu observando como, e cada vez mais, as crianças estão se parecendo com seus pais. Não só na aparência externa, com roupas cada vez mais apelativas e, muitas vezes, beirando a vulgaridade, mas também no método de encarar as coisas. As crianças estão cada vez mais críticas, porém num sentido de independência e de seguirem uma linha própria de vida. Tudo isso com uma diferença em relação à Idade Média: um grande sistema econômico, ancorado pelos mais poderosos instrumentos de persuasão - e por que não coerção -, que faz da criança um target estratégico para o seu ataque.

É curioso observarmos esse processo. E mais interessante é tecer uma conjuntura futura: como será o perfil da criança daqui a 50 anos? Será que será vista como um "adulto pequeno", como há séculos atrás? Porque na Idade Média, crianças presenciavam sem problemas cenas de sexo entre os pais e viviam de forma relativamente independente.

Se antes a criança não era "privada" - como vai se tornar com a estruturação da célula familiar burguesa - e tinha sua tutela resguardada na prática não pelos pais mas pela coletividade, hoje nós observamos uma conjuntura parecida. Só mudaram, fundamentalmente, os sujeitos do controle: hoje um sistema econômico absolutmente dinâmico e que caminha numa direção já previsível.

Ao constatar essa morte da infância fico, não sei se devido a nostalgia, fico meio triste. Sei que é uma construção histórica, como a figura da "mãe", do "pai" e da "família". Mas eu creio, que fora as minhas fraquezas nostálgicas, ser criança, e de uma forma bem categórica, é algo extremamente necessário para a construção de um adulto centrado, com um ego seguro, sadio e favorável ao seu desenvolvimento a posteriori.

Tomara que não tenhamos um retrocesso. Que o que adquirimos em todos esses anos, com os avanços das ciências humanas, possa nos "iluminar" mais uma vez, mas no sentido do desenvolvimento humano e da formação de uma sociedade menos numérica. A humanidade da criança é um dos únicos encantos que ainda nos restam...

Um comentário:

Guilherme Genestreti disse...

"A humanidade da criança é um dos únicos encantos que ainda nos restam". Rido, isso é muito bonito mesmo. Gostei bastante do texto! Também me faz pensar nos mini-adultos que querem imitar seus pais e de como isso parece tão podre, né?